Rota Bioceânica é promissora, mas precisa de ajustes no caminho
A Rota Bioceânica já está saindo do papel e promete ligar o Brasil ao Oceano Pacífico, passando por Paraguai, Argentina e Chile. Com mais de 2.300 quilômetros, o corredor vai conectar portos dos dois oceanos e pode reduzir o tempo e o custo de exportações para países da Ásia, como a China.
O plano é ambicioso — e animador. Mas, como toda grande obra, ainda precisa de ajustes importantes antes de funcionar 100%. Especialistas apontam alguns pontos de atenção que devem ser resolvidos até a inauguração completa, prevista para os próximos anos.
Caminhão do agro ainda não sobe a serra – O grande desafio físico está na travessia da Cordilheira dos Andes, trecho mais alto e sinuoso do trajeto. Os caminhões grandes e pesados, como rodotrens e bitrens que levam soja no Brasil, não conseguem passar por lá.
Segundo o professor Eduardo Casarotto, da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), esses veículos enfrentam dificuldade de força nas subidas e não são permitidos nas estradas da região. “A soja, por enquanto, não deve seguir por esse caminho”, explica. Mas ele também lembra que outras cargas, como carne e suco de laranja, são totalmente viáveis para a Rota, usando carretas menores.
A boa notícia é que, com a Rota funcionando, Mato Grosso do Sul pode virar um ponto estratégico de distribuição de produtos e até aumentar a importação de gás da Argentina.
Projeto avança, e obras já mostram resultado – As obras estão em ritmo acelerado. A ponte entre Porto Murtinho (MS) e Carmelo Peralta (Paraguai), uma das partes mais importantes do corredor, está quase pronta e é financiada pela Itaipu Binacional. Segundo o Ministério dos Transportes, as rodovias BR-267 e BR-060, que fazem parte do trecho brasileiro, também passam por melhorias.
Ponte bioceânica vai ligar Porto Murtinho a Carmelo Peralta
Para o setor agropecuário, a expectativa é grande. O presidente da Aprosoja-MS, Jorge Michelc, está confiante: “A Rota Bioceânica é uma janela de oportunidades. Com o tempo, vamos superar os obstáculos e ter um novo caminho para exportar.”
Faltam motoristas, mas solução já está em curso – Além da infraestrutura, o projeto também esbarra na falta de profissionais capacitados. O presidente do SetLog-MS, Claudio Cavol, alerta que hoje o Estado tem déficit de mais de 15 mil caminhoneiros.
“Se tivéssemos 10 mil motoristas prontos, todos estariam empregados agora”, afirma.
A preocupação aumenta porque o movimento vai crescer com a nova rota. Para Cavol, o Brasil precisa preparar esses profissionais com urgência. Ele destaca que dirigir em rotas internacionais exige conhecimento de outras regras, mais segurança nas estradas e, em alguns casos, até saber o básico de espanhol.
Mas há iniciativas em andamento. O governo estadual oferece desde 2023 o programa Voucher Transportador, que dá curso gratuito para formar motoristas de ônibus e caminhões. Em 2025, são 3 mil vagas disponíveis. O curso, feito em parceria com o Sest/Senat, inclui teoria e prática e custa cerca de R$ 3,5 mil por aluno, pagos pelo governo.
Cavol vê com bons olhos: “Esse programa é essencial. Já é um começo forte para resolver o problema.”
Burocracia nas fronteiras ainda precisa melhorar Outro ponto importante é a integração entre os países. Para a Rota funcionar bem, Brasil, Paraguai, Argentina e Chile precisam alinhar documentos, normas e processos alfandegários. Segundo Cavol, a burocracia ainda é um entrave.
“O Brasil já tem regras complexas. Agora imagina somar as dos outros três países? Isso pode afastar pequenas empresas.”
Apesar disso, ele acredita que a integração será ajustada com o tempo, principalmente com apoio das autoridades dos quatro países. “A Rota não é só uma estrada. É um novo jeito de fazer comércio. E isso leva tempo pra organizar”, resume.
Fonte: A Crítica